
A Telesmata é a palavra que designa a confecção de talismãs como a confecção de uma Imagem divina onde complexos procedimentos teóricos e práticos se encontram a fim de efetivar uma antiga filosofia presente na maioria das escolas de magia.
A base da magia talismânica tanto quanto a maior parte da magia cerimonial, clássica, é a ideia do Vinculum Vinculorum ou a “Corrente das Correntes”, que é Eros de Giordano Bruno, como a capacidade de exercer o prazer sensual ou da atração psico-sexual (não necessariamente física) para manifestar uma unidade ativa e transformadora.
A “fantasia” como um artifício artístico abarca a capacidade imaginativa que conecta elementos naturais com aspectos divinos, ancorando os Céus na Terra ou o Espírito-Pneuma na Matéria-Hílica e fazendo até milagres ocorrerem e posto isso eu diria que a Teurgia, para mim, é a efetiva manifestação e unificação do Trabalho Pneumático-Espiritual na realidade Material-Hílica, simplesmente dizendo é a fundamentação de qualquer prática mágica efetiva.
Se você achou até aqui, contudo, que na magia e feitiçaria clássica era só imaginar alguma coisa com muito fervor que você ia poder dobrar o mundo ao seu bel prazer… tenho algo pra te dizer:
A força espiritual é volátil, ágil, incorrompível e nos escapa sempre que achamos poder condensá-la em qualquer tipo de objetividade, ainda assim essa “caça” sempre nos rende bons frutos e ao analisarmos as pegadas e traços de nossa “presa” nós adquirimos mais e mais medidas e conhecimentos que nos possibilitam, ainda em vida, encontrar meios para alcançar essa realização.
A forma material por sua vez é (embora não “maligna) estagnada na realidade, corrompível, ilusória, fixa e embora mutável é um tanto quanto agarrada a sua matriz de manifestação. Se, contudo, conseguimos volatilizá-la, isto é, encontramos em nós a capacidade de espiritualizarmos, ou melhor, de realizarmos a natureza e virtude espiritual latente, nós estaremos em vida trazendo uma porção dos céus para a terra e elevando uma porção da terra aos céus.
Portanto nossa Alma se transmuta, transmigra em uma Imagem Divina “Assim na Terra como nos Céus” capaz de realizar sua natureza “como os deuses” e tomar em suas mãos seu Destino embora poucos saibam o que isso verdadeiramente significa e talvez se soubessem não desejariam tão fortemente encontrar-se com essa ordália. Por simples analogias e percepções psicológicas, até inconscientes, o mago pode realizar tal ancoragem de forma “simpática”, isto é, por similitude onde elementos percebidos conscientes e inconscientemente formam a disposição e aptidão a serem evocadas (externalizadas) como algo divinamente inspirado.
Nisto, jaz uma complexa filosofia onde “Tudo” (todas as coisas individuais) são partes presentes no Todo (A Totalidade, o UM) e para tanto, as “partes” deste prisma ou joia compõem uma realidade multifacetada e naturalmente emanam, refletem e são preenchidas por uma substância invisível, uma luz astral, uma matéria prima cósmica, negra, ao qual por reificação (transformar conceitos abstratos em objetos) o feiticeiro-mago realiza a ancoragem das estrelas na cruz da matéria física.
Através da Imaginatio Vera, a fantasia transcendental ou “Imaginação Verdadeira”, o mago consegue replicar o Ovo Órfico primordial, o Vaso e Útero da Criação onde o Filósofo, o verdadeiro mago, se torna não só um peregrino mas também um malabarista, um alquimista, um louco e finalmente um sábio-mago.
Plotinus, iniciador do neoplatonismo, estabelece a raiz de tal doutrina metafísica onde a Mônada, a Unidade Universal, causa e gera outros níveis e emanações de existências chamadas de “hipóstases” como realidades essenciais e substanciais para a manifestação do Divino, máscaras universais e ancestrais de “Deus”.
Dessas hipóstases, convém citar o/a Nous que é a Mente Divina ou o Divino Intelecto, fundamentalmente andrógeno e análogo, de certa forma, à uma substância à lá Proteus, manifesta, mercurial e transformativa.
- Se por um lado tal substância feminina Ela se manifesta, ao nosso ver, como Dama Sabedoria, o Destino-Fado (Ananke, Nornas, Hekate) e a Mãe Natureza (Cósmica, não somente terrestre) descrita em Provérbios 8.
Mãe. - Se por outro a substância é percebida como masculina Ele é, ao nosso ver, o Titânico “Pai de Todos’, Cain, Aegipan, Anu, Aion, Chronos, Pimandro, Poimandres, a Ordem Cósmica ativa, o Logos e o Pastor Divino dos Homens. Pai.
- Ambos se conectam e são expressos no Grande “Eu Sou” ou “Eheye Asher(a) Eheye”, o Redentor, o “Reverendo”, Lúcifer, Eros (Daemum Magnus) e Phanes o Revelador. Filho/a.
Como um órgão e faculdade da Alma a imaginação aborda a uma realidade intermediária ou da Mente Divina, do Mundo Noético, em que o Um (Unidade) se torna primeiramente Nada para depois se tornar Tudo e a partir disso retornar e extrair a quintessência pneumática, espiritual, de um dado objeto externalizando a mesma e fazendo com que o próprio magista se torne o Divino por ato de replicação de pares e semelhantes e que o Divino se torne o magista pelo mesmo princípio.
Do Nous, a Mente Divina, a Unidade se desdobra dos “Véus Negativos” para os Positivos e adiante como 7 Arcontes que se relacionam diretamente com as esferas clássicas dos planetas e certos pontos no corpo humano que, quando incitados corretamente, se tornam um veículo, um Compasso para o sábio.
Segundo o gnosticismo e o hermeticismo a Alma deve descender pelos Sete Arcontes antes de chegar nessa realidade e ao deixá-la a mesma deverá passar em ascensão novamente pelos Sete Portais (de percepção) a fim de transcender ao mundo angelical, celestial da Mente Divina – O Nous. Em seus primórdios essas Sete Divindades eram tidas pelos povos caldeus e mesopotâmicos como sendo os regentes do Destino da Humanidade que dispensam a “fortuna” e os “lotes” dos homens, deuses neutros mas capazes de ambos “bem” e “mal” de acordo com os decretos da Dama Fortuna/Necessidade/Fado e posteriormente assimilados e relacionados com Sete Anjos/Arcanjos e Sete Demônios durante a Idade Média.
De acordo com a Tradição Mística, o objetivo de uma pessoa sábia seria quebrar com os ciclos de repetição e “subjugação” pelos quais os Arcontes exercem suas influências. Ao superar seu lote, seu destino seria superado e o Verdadeiro Graal seria encontrado: o Argent-Vive da Alquimia e a natureza real do Mercúrio Três Vezes sábio, a Matéria Prima da Mônada (Unidade).
Curiosamente, muitas vezes os Arcontes são tidos como pares de Masculino-Feminino, dando a noção de uma androgenia/hermafroditismo espiritual ou, as cobras do cajado de Hermes, embora verdadeiramente, sugerindo um terceiro pensamento onde uma nova, terceira realidade surge além de qualquer gênero físico mas sim intrinsecamente conectados por uma virtude inerente.
Em nosso corpo, os Sete Arcontes como já mencionados configuram Sete Centros Energéticos que causam uma inundação de substâncias físicas e espirituais “rio-acima”, possibilitando o encontro de nosso fogo invisível do Lúcifer Interior, o Deus Negro dentro de nós.
O “Rei Sol” (Vermelho) da Alquimia representa o lado Direito do corpo e o Pilar da Iluminação-Forma, enquanto a Rainha Branca/Preta/Azul corresponde com o Pilar Esquerdo da Escuridão-Força, ambos facetas e manifestações do influxo Divino. Tal presença e corrente comumente aparece como um raio ou espada de fogo celestial, estelar, descendendo pelos portais dos sábios até que, incitado pelo som do Nome Sagrado composto de certas vogais, revela seu Mistério, como o Homem-Mulher Primordial (Dourado), a sagrada imagem da Humanidade se revela. Aqui, Homem conhece Lúcifer em si mesmo.
Transmutando-se pela morte ou ausência de suas armaduras e roupagens, nu e exposto para a Noite requerida ao Trabalho, o Espírito penetra a Alma residente e por retificação ao volatilizar o fixo e fixando o volátil, a Forma-Força Divina, unificada em seu vaso, o Ovo do Filósofo, ascende como uma serpente alada por entre os mesmos portais pelo qual o fogo estelar descendeu, passando por seus guardiões, Vigílias da Sabedoria, e vencendo-os o sábio recupera sua joia, a Lapis Exilis, o Graal que serve a todas as necessidades. Aqui o Homem é como os Deuses.
Este é a fórmula de 7 letras do V.I.T.R.I.O.L no corpo do Homem: “Visita Interiorem Terrae, Rectificando, Invenies Occultum Lapidem” ou Visita o Centro da Terra, Retificando-te, encontrarás a Pedra Oculta (ou Filosofal).
Pela Cruz, o quaternário terreno: Água, Fogo, Terra e Ar, aqui na Terra-Média o homem entra em um estado de “entre-mundos” e suspenso, guiado por seus ancestrais ele se depara com a realização de que “Eu sou o Sacrificador, o Sacrifício e o Sacrificado”, como diz nossa prece e bênção.
Em nossa ciência o “Rei” se manifesta em nosso corpo como a Cabeça, o Coração e a Raiz, como Pai, Filho e “O Irmão” a ser “retificado” e reabsorvido na Trindade como uma capacidade unificadora e conectiva.
Um é eterno e o outro é temporário, um é mortal e o outro imortal, um é “lunar” e o outro “solar” ou talvez “diurno” e “noturno” seria melhor dizer, um é revolto e o outro é estável, um é evolução e o outra estagnação a ser combatida, um é agricultura e o outro é o caçador-nômade-coletor, um é do Espírito e outro da Carne e ainda assim, ambos são retificados em uma terceira e perfeita unidade. Inclusive vale notar que em algumas versões, como em Cain e Abel os irmãos não se entendem e precisam se superar para progressão mas em outras como em Emesh e Enten os aparentes opostos são reconciliados a despeito de muita disputa violenta (ninguém disse que seria fácil, não é?).
Para complementarmos nosso estudo, vamos analisar as palavras de Hermes Trimegistus o Divino Pastor em seu diálogo:
- Porque o primeiro deve guerrear contra si mesmo e depois de muito Conflito e Dissensão, isto deve ser superado de uma parte; pois a Contenda é de um contra dois, enquanto ela voa e eles se esforçam para segurá-la e detê-la.
- Mas a vitória de ambos não é igual; porque um se apressa ao que é Bom, mas o próximo é vizinho daquelas coisas que são Más; e aquilo que é Bom, deseja ser posto em liberdade; mas as coisas que são mal, amam o Cativeiro e a Escravidão.
- E se as duas partes forem superadas, elas ficam quietas e estão contentes em aceitar isso como seu Regente; mas se o um for superado pelos dois, ele é liderado e carregado por eles para ser punido pelo seu ser e continuar aqui.
- Este é, Ó Filho, o Guia no caminho que leva para lá, pois você deve primeiro abandonar o Corpo antes do seu fim, e obter a vitória nesta Contenda e na vida Conflituosa, e quando tu tiveres superado, retorne.
Filho e Irmão formam a dinâmica dos “tanists”, do Predecessor e Sucessor ou Velho e Novo Rei, Carvalho e Azevinho. A Rainha é Celestial, Terrestre e Infernal, branca para trabalhos de bondade e enegrecida para os de escuridão, tal como Cochrane professava e tal como Graves e Redgrove ambos especularam e buscaram a Deusa Branca e a Deusa Negra, respectivamente.
Para finalizar, ofereço a contemplação da obra do Dr. John Dee que sabiamente formulou um sigilo místico com traços dessa ideia em sua Monas Hieroglyphica onde todos os símbolos planetários se entrelaçam para formar uma Unidade (a Mônada) coesa:
Na imagem podemos ver de forma simples a Lua, o Sol, os Elementos e o Fogo Divino (Shin) como também parte da trindade Cósmica Kabbalística, das três Mães. Em uma análise mais profunda, contudo, podemos ver, inclusive, todos Sete Planetas expressos neste simples mas efetivo sigilo:
– Lagrillon.